Depois de um 2011 complicado nas relações entre Brasil e Argentina, que colocou travas às exportações de calçados e móveis, em 2012 o quadro pode ser agravado. Isto porque a partir 1.º de fevereiro, o governo Cristina Kirchner exigirá que importadores declararem antecipadamente suas compras, o que afetará os produtores brasileiros. A nova regra comercial levou os empresários argentinos a pedir ontem suspensão da medida, assunto que será novamente tratado hoje. O Palácio do Planalto avalia a decisão e não descarta uma resposta ao país vizinho.

Problema permanente

O ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, manifestou descontentamento com as restrições cada vez maiores. “A Argentina tem sido um problema permanente. Temos boas relações políticas, mas, economicamente, é difícil lidar com eles”, afirmou. Hoje, o Brasil tem superávit comercial de cerca de US$ 6 bilhões com o país vizinho.Em nota oficial, o ministério diz ter feito contato com o governo argentino para avaliar os possíveis impactos nas exportações brasileiras.

As regras

A partir de fevereiro, os importadores argentinos terão de obter aprovação prévia da autoridade tributária do país antes de fazer qualquer compra no exterior.

O novo mecanismo de controle atingirá mais de 10 mil importadores argentinos. A declaração antecipada é tanto para o ingresso de produtos finais como de insumos para a indústria.

A declaração deve ser feita antes de os empresários efetuarem a ordem de compra no exterior. A oficialização da importação só será feita depois que o governo der o visto de ok sobre a operação, prazo que não deve exceder 15 dias.

A presidente Cristina Kirchner, que iniciou seu segundo mandato no mês passado, assinou uma série de medidas protecionistas, entre elas a expansão da lista de produtos sujeitos ao demorado procedimento de licenciamento prévio para importação e a obrigação de que as empresas equiparem suas importações com exportações de igual valor.

Indo na contramão da globalização

Para o presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e Eletrônico do Rio Grande do Sul (Sinmetal), Gilberto Petry, o intenso protecionismo da Argentina está contrariando o que é praticado por outros países. “Isso está na contramão do que os demais países fazem. O Brasil não tem isso, os Estados Unidos não tem isso”, exemplificou. “Está na contramão da globalização”. Segundo ele ainda não é possível avaliar o quanto esta medida afetará a indústria.

Abicalçados defende retaliação como saída

Para o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, as novas restrições representam mais entraves à entrada de calçados no país vizinho, que desde o ano passado vem atrasa a liberação das licenças de importação, que chegaram a passar de 200 dias, quando o prazo da Organização Mundial de Comércio (OMC) é de 60 dias.

Segundo ele, atualmente há cerca de 3 milhões de pares de sapatos brasileiros retidos na alfândega por falta de liberação – pelo acordo entre a Abicalçados e a Câmara da Indústria da Argentina, o Brasil poderia exportar 15 milhões de pares em 2011, mas até dezembro só conseguiu enviar 13,76 milhões de pares. “A única saída é a retaliação. O governo federal deve abrir processo contra a Argentina no Mercosul”, disse Klein.

Acordo

Vale lembrar que em dezembro venceu o acordo (exportação de 15 milhões de pares) que é monitorado pelo governo dos dois países. Na Argentina, já há movimento para se sentar novamente na mesa de negociações, mas ao que depender da Abicalçados o acordo não deve ser muito fácil este ano.

O argumento dado pelo presidente da associação brasileira dos calçadistas, Milton Cardoso, na Couromoda, foi de que não houve cumprimento do acordo pela Argentina. Conforme ele, 75% dos calçados importados pelos argentinos seriam do Brasil e o restante de outras origens. “Não foi isso o que aconteceu. A Argentina chegou a ter 50% dos calçados importados de outras origens. Por isso, creio que não há possibilidade para um novo acordo.”

Móveis gaúchos perdem espaço

Para o presidente da Associação das Indústrias de Móveis do Estado do Rio Grande do Sul (Movergs), Ivo Cansan, cada medida do país vizinho para proteger a indústria local é um ataque ao setor moveleiro gaúcho. “A briga é com o Estado do Rio Grande do Sul. Ele (governo da Casa Rosada) está visualizando uma possibilidade das indústrias se instalarem na Argentina”.

Como defesa de sua tese, disse que enquanto o Brasil cresceu 25% nas exportações de móveis para a Argentina em 2011, o Estado gaúcho perdeu 21% do mercado. “O Rio Grande do Sul chegou a ter 40% do mercado, hoje detém pouco mais de 12%, e a cada ano perdemos mais espaço”, afirmou. Segundo ele, dos US$ 150 milhões exportados pelo País em 2011, o Estado só representa US$ 17 milhões.

Veículos argentinos ficaram de fora da elevação de IPI

No final do ano passado, o governo Dilma Rousseff havia aumentado os impostos para veículos importados, medida que vigora até 31 de dezembro deste ano. O Imposto de Produtos Industrializados (IPI) para carros e caminhões teve aumento de 30%, o que pode representar um aumento de 25% a 28% no preço dos carros importados. No entanto, a Argentina ficou de fora da medida, pois suas fábricas atingem a exigência de terem no mínimo 65% de conteúdo nacional ou regional.

Saiba mais

A Argentina é o segundo principal país a receber exportações do Rio Grande do Sul, atrás apenas da China.

Segundo dados da Fundação de Economia e Estatística (FEE), entre janeiro e novembro de 2011 foram exportados US$ 1.813.954.995 bilhão, em uma participação de 10,04%.

Em 2010 haviam sido exportados no mesmo período US$ 1.480.253.791 bilhão, representando 10,49% das exportações. Hoje a FEE divulga os dados totais das exportações gaúchas em 2011.

fonte: Jornal NH